APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO ODONTOLÓGICO. IMPLANTES DENTÁRIOS. TRATAMENTO DE CANAL.
Responsabilidade civil. As rés, ABO/RS e PUCRS, na qualidade de prestadoras de serviço odontológico, estão submetidas às disposições do Código de Defesa do Consumidor e respondem independentemente da existência de culpa, com base no artigo 14 do aludido diploma legal. Tratando-se de defeito na prestação do serviço, faz-se necessária a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta e o dano, de modo que a responsabilidade é afastada apenas quando demonstrada a ocorrência de alguma excludente legal.
Caso concreto. A contratação com a ABO/RS foi no sentido de realizar implantes, tão somente, e não de resolver um problema específico de oclusão, incorrigível com a mera restauração dentária. Responsabilidade civil não verificada no ponto. Dano material não caracterizado, porque requerido apenas em face da ABO/RS. Todavia, com relação à segunda demandada, evidenciada está a falha na prestação do serviço, uma vez que demonstrada a presença de material endodôntico no elemento dental que foi submetido a tratamento de canal. Dores agudas experimentadas pela autora, assim como a necessidade de extração do dente, que desbordam do esperado para o caso em tela. Responsabilidade concorrente da paciente, que aguardou longo período para buscar solução para a questão. Dano moral configurado.
Quantum indenizatório. A indenização por danos morais visa a reparar o sofrimento da autora ao experimentar anormal situação decorrente da dor persistente após realizar tratamento de canal, necessitando inclusive extrair o dente. Demora na solução do problema que não pode ser atribuída exclusivamente à PUCRS, tratando-se de responsabilidade concorrente da paciente. Montante reparatório que, além da finalidade pedagógico-punitiva, tem função reparadora e deve observar aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Valor de R$ 5.000,00 que deverá ser monetariamente corrigido e acrescido de juros moratórios.
Sucumbência. Diante do presente resultado, imperiosa é a redistribuição parcial dos ônus sucumbenciais.
APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
Apelação Cível
Nona Câmara Cível
Nº 70079445615 (Nº CNJ: 0309773-59.2018.8.21.7000)
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Comarca de Porto Alegre
APELANTE
UBEA - PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATOLICA DO RIO GRANDE DO SUL
APELADA
ABO- ASSOCIACAO BRASILEIRA DE ODONTOLOGIA /SECAO DO RIO GRANDE DO
APELADA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em prover parcialmente a apelação.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Eugênio Facchini Neto (Presidente) e Des. Eduardo Kraemer.
Porto Alegre, 28 de novembro de 2018.
DES. CARLOS EDUARDO RICHINITTI,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Carlos Eduardo Richinitti (RELATOR)
Trata-se de recurso de apelação interposto por ----------, nos autos da ação indenizatória ajuizada contra a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ODONTOLOGIA – SEÇÃO RIO GRANDE DO SUL – ABO/RS e a UBEA - PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL, em face da sentença que julgou improcedente a demanda, fls. 219/223v, condenando a autora a pagar custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 15% do valor corrigido da causa. Suspensa a exigibilidade da verba sucumbencial diante da gratuidade judiciária.
Em suas razões, fls. 226/235, aduz que o seu martírio teve origem a partir de tratamento inadequado feito pela ABO/RS que, incapaz de solucionar os problemas que causou, indicou à autora que procurasse a corré PUCRS. Sustenta que houve supervisão negligente dos professores da universidade, afirmando que as dores sofridas pela requerida se tornaram ainda mais intensas e perduraram por quatro anos. Refere que o tratamento realizado pela ABO/RS foi frágil e ineficaz, uma vez que deveria ter permitido o contato oclusal entre os dentes da autora, o que não ocorreu, causando-lhe intenso sofrimento. Diz ter sentido uma dor lancinante a partir do tratamento de canal realizado no dente 14 junto à PUCRS, o que poderia ter sido evitado pela própria prestadora do serviço, porém não foi feito. Assevera que o cirurgião-dentista que posteriormente atendeu a autora e prestou testemunho foi enfático ao dizer que a paciente vinha de um abscesso dentário em torno do dente 14, razão pela qual entendeu por extrair o dente. Relata que após a extração a dor no dente 14 cessou, e defende a responsabilidade civil da parte ré. Requer a reforma da sentença a fim de ser julgada procedente a demanda, condenando-se as requeridas a pagar indenização por danos morais e materiais.
Apresentadas contrarrazões nas fls. 137/240 por UBEA - PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL, a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ODONTOLOGIA – ABO/RS deixou transcorrer in albis o prazo, fl. 243.
Após, subiram os autos a esta instância, vindo-me, então, conclusos para julgamento
É o relatório.
VOTOS
Des. Carlos Eduardo Richinitti (RELATOR)
Recebo o recurso interposto, porquanto atendidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.
Na inicial, narra a autora que no ano de 2007 iniciou uma sequência de procedimentos e tratamentos dentários com a primeira requerida, ABO/RS, para que fossem realizados implantes dentários. Sustenta que os permanentes não ficaram encaixados na arcada dentária superior, sendo colocada massa para que os dentes se tocassem, o que causou fragilidade na arcada superior e fez com que dentes se quebrassem. Alega que durante todo o tratamento reportou ao responsável as dores constantes, porém apenas teve como resposta a orientação de tomar relaxante muscular. Assevera que foi tratada com agressividade quando questionou a ABO/RS sobre a qualidade do tratamento, sendo que, ao final, lhe foram cobrados valores maiores do que o combinado. Alega que pagou por dois pinos e cinco coroas, tendo sido usados apenas um pino e quatro coroas. Destaca que em meados de 2010 quebrou um dente, o que ensejou a necessidade de fazer tratamento de canal, procedimento não realizado pela ABO/RS, pelo que restou encaminhada à segunda requerida, PUCRS. Relata que entre os meses de setembro e dezembro de 2010 realizou tratamento endodôntico com a segunda requerida, comparecendo quinzenalmente para atendimento. Afiança que desde o segundo dia de tratamento na PUCRS sentiu dores fortes do lado direito do rosto, o que por diversas vezes a impossibilitou de exercer as suas atividades diárias. Refere que, mesmo após o relato de muita dor, o Dr. Márcio, da PUCRS, disse que o canal estava tratado, dando por encerrado o tratamento, apenas com receita de alguns anti-inflamatórios. Acrescenta que, passados alguns dias do final do tratamento na PUCRS, observou que as dores permaneciam intensas, e que, ao tentar contato com a parte requerida, a informação foi de que nada poderia ser feito. Destaca ter realizado tomografia volumétrica após o procedimento, o que apontou a presença de material endodôntico além do ápice da raiz no dente 14, assim como raiz trincada. Narra sentir dores nos maxilares, face e ombros, além de sofrer com sequelas das modificações de sua face, dizendo que sua boca ficou “para baixo” e suas feições mudaram. Destaca que passou a desenvolver quadro depressivo devido ao grande nível de estresse pelas constantes dores que sentiu. Alega que as rés agiram de forma negligente e imperita ao não realizarem o tratamento dentário eficaz, pelo que postula seja julgada procedente a demanda indenizatória a fim de ver condenadas as rés a pagarem R$ 8.140,00 de danos materiais e R$ 18.660,00 de danos morais.
A sentença foi de improcedência, insurgindo-se a apelante contra tal decisão, fls. 179/190. O provimento dado pela Magistrada de origem merece parcial reparo.
In casu, é incontroverso que a autora buscou atendimento na ABO/RS para que fossem realizados implantes dentários, assim como junto à PUCRS para efetuar tratamento de canal.
A controvérsia do presente feito reside na causa (e consequente responsabilidade) da demora na solução do caso, das fortes dores que a requerente narrou sentir, bem como da suposta modificação de sua face.
Inicialmente, no que tange à alegada alteração de feições no rosto da recorrente, tenho que não há qualquer prova de sua ocorrência no presente caso.
Embora alegue a requerente que tenha ficado com a boca “para baixo” após o tratamento realizado com as requeridas, não há um indício sequer nesse sentido. Veja-se que em audiência de instrução não foi ventilada a questão, e a perícia, em resposta a quesitos, restou categórica no sentido de não ser possível a ocorrência da modificação de face como decorrência do tratamento a que se submeteu a autora, fl. 131.
Logo, no tópico, não há o que reparar.
Todavia, relativamente ao pleito indenizatório decorrente das fortes dores sofridas pela apelante em função da má prestação de serviço, tenho que carece de parcial reforma a sentença.
As rés, ABO/RS e PUCRS, na qualidade de prestadoras de serviço odontológico, estão submetidas às disposições do Código de Defesa do Consumidor e respondem independentemente da existência de culpa, com base no artigo 14 do aludido diploma legal.
Tratando-se de defeito na prestação do serviço, faz-se necessária a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta e o dano, de modo que a responsabilidade é afastada apenas quando demonstrada a ocorrência de alguma excludente legal.
Nesse sentido:
APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. SERVIÇOS ODONTOLÓGICOS. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. FATO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO DENTISTA. A obrigação assumida pelo cirurgião dentista, em regra, é de resultado, sendo a responsabilidade subjetiva, com culpa presumida. Ou seja, é do profissional o ônus da prova no sentido de que não agiu com culpa. Incidência do art. 14, § 4º, do CDC. RESPONSABILIDADE CIVIL DA CLÍNICA ODONTOLÓGICA. A clínica responde independentemente de culpa pelo serviço defeituoso prestado ao consumidor, na qualidade de prestadora de serviços, incidindo a responsabilidade objetiva prevista no art. 14 do CDC. DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO. Da análise da prova produzida é possível concluir pela existência do dever de indenizar da ré. A prova pericial concluiu que, após extração dentária houve uma comunicação bucosinusal com a presença de dois fragmentos apicais radiculares na cavidade sinusal. Tal complicação deveria ter sido tratada imediatamente, contudo, não foi o que ocorreu na hipótese, pois o fato não foi percebido ou comunicado à autora no momento da extração, mas somente no seu retorno à clínica. Outrossim, a autora foi submetida a diversos procedimento cirúrgicos com a clínica ré sem êxito na solução do problema, que apenas foi resolvido por iniciativa própria da demandante que procurou um profissional especializado. (...) APELAÇÃO DESPROVIDA. RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70075557678, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Kraemer, Julgado em 26/06/2018). Grifei.
No caso concreto, tenho que resta demonstrado defeito na prestação do serviço por parte da PUCRS, não restando verificada falha na conduta adotada pela ABO/RS.
É fato incontroverso nos autos que a autora contratou com a ABO/RS a realização de implantes dentários, o que resta corroborado pelos documentos acostados nas fls. 20, 23, 78/83, 106/113.
A demandante alega que diante de um problema de oclusão acabou enfraquecendo a arcada superior e quebrando o dente 14, o qual foi posteriormente objeto de tratamento de canal e causou-lhe fortíssimas dores.
Pois bem, ainda que o problema de oclusão na paciente tenha persistido após a realização dos implantes, o que não se ignora, o fato é que a contratação com a ABO/RS foi no sentido de restaurar os dentes, tão somente, e não de resolver um problema de oclusão (muitas vezes solucionável através de aparelho ortodôntico).
Do exame pericial, fls. 128, verifica-se que há falta de contato também em outros dentes não envolvidos neste processo, o que demonstra que a autora sofre de um problema oclusivo cônico e independente dos implantes realizados pela ABO/RS – tratável via reabilitação específica, repiso.
Ainda do laudo, depreende-se que os pinos dos implantes realizados pela ABO/RS foram corretamente posicionados e perfeitamente osteointegrados, implantados na mandíbula da demandante para a reabilitação dos dentes 37 e 46, fl. 127/129.
Em laudo complementar, fl. 173, a expert referiu que a reabilitação oclusal é um tratamento de que a autora necessita para conseguir maior equilíbrio, não consistindo em fase posterior do tratamento adotado pela parte requerida.
Não obstante, há referência a diagnóstico de bruxismo, fl. 60v, do que se conclui que as dores musculares relatadas podem estar associadas a este quadro, assim como a trinca do dente 14, o qual foi posteriormente objeto de tratamento de canal.
De qualquer forma, ainda que não seja bruxismo a causa de dor aguda no dente 14, o fato é que não há prova da má prestação do serviço de implante dentário realizado pela ABO/RS, descabendo responsabilizar a aludida demandada pelos danos alegados – morais e materiais.
Vale destacar que há referência nos autos de que a paciente deixou de comparecer na sede da ABO/RS para dar continuidade ao tratamento, fl. 80, o que ainda mais enfraquece a tese autoral.
De tal modo, não verificando falha na prestação do serviço prestado pela ABO/RS, entendo por manter a sentença no ponto.
Outrossim, relativamente ao serviço oferecido pela PUCRS, vislumbro que, neste sim, houve a ocorrência de falha.
Também é fato incontroverso, corroborado pelos documentos acostados nas fls. 21/22 e 58/64, que a postulante se submeteu a tratamento de canal no dente 14 na PUCRS, com triagem realizada em 02/06/2010.
Consoante documentação dos autos, a última consulta da requerente junto à PUCRS se deu em 02/03/2011. Segundo tomografia realizada em 27/01/2012, fl. 27, foi verificada a presença de material endodôntico além do ápice da raiz palatina do elemento dental 14, sugerindo também a presença de trinca ou fratura.
Do exame pericial realizado em juízo, vê-se que houve extravasamento de material obturador no dente 14 durante a fase de selamento dos canais radiculares, o que, segundo a perita, se caracteriza como um acidente no decurso do tratamento de canal e costuma causar dor, sensibilidade, até o organismo reabsorver o excesso de material e encapsular o restante, se necessário, fl. 129.
A própria PUCRS, em contestação, fl. 48, reconheceu que depois de realizada a desobstrução do canal foi constatada uma sobreobturação no dente 14 da autora, o que poderia ser a causa da sensibilidade à percussão realizada na consulta do dia 02/03/2011.
Ainda que alegue a PUCRS que o tratamento de canal do dente 14 tenha sido realizado de acordo com as técnicas adequadas, não há dúvidas de que houve falha no serviço por ser constatada a presença de sobra de material no dente da paciente, o que é reconhecidamente causador de desconforto e sensibilidade.
Segundo relato de -----[1], cirurgião dentista que prestou atendimento à autora, fls. 190/191, e realizou a extração de seu dente 14 posteriormente ao atendimento prestado pela PUCRS, o local tinha abcesso e a dor da paciente era aguda, localizada, sendo que quando realizou percussão no dente a paciente pulou.
A citada testemunha afiançou que na região apical do dente 14 existia bolsa indicando lesão, inflamação, e a paciente já estava tomando antibiótico na ocasião.
A requerida, por sua vez, devidamente intimada, afiançando a desnecessidade de produzir prova oral, fl. 192, não arrolou qualquer testemunha para elucidar a questão.
Ora, entendo que resta demonstrado pela autora fato constitutivo do direito alegado. Isso porque, não sendo a sobra de material algo que se espera do atendimento odontológico prestado, e havendo reconhecimento de que tal situação é capaz de ensejar a intensa dor sentida pela paciente, verificada está a falha na prestação do serviço prestado pela PUCRS, o dano sofrido, e o consequente dever de indenizar.
Todavia, ainda que seja devida a indenização, imperioso destacar que houve também responsabilidade da parte autora pelo longo prazo de dor.
Veja-se, em defesa, fl. 48, alegou a PUCRS que a paciente deixou de comparecer na consulta agendada para meados de março de 2011, abandonando o tratamento já iniciado – fato não impugnado especificamente em réplica, fls. 85/87.
Além disso, do relato da testemunha arrolada pela autora, cirurgião dentista, depreende-se que Denise procurou o profissional para realizar a extração do dente 14 somente no ano de 2014, reforçando a ideia de demora por parte da paciente em buscar ajuda.
Ainda que a postulante tenha optado por aguardar a autorização judicial (desnecessária, grife-se, porque nunca proibida a continuidade do tratamento) para buscar ajuda de outro profissional, fls. 134 e 140, o fato é que a demora na resolução do problema não pode ser totalmente atribuída à PUCRS.
Note-se, já em janeiro de 2012 a requerente possuía laudo de tomografia informando a presença de material endodôntico no dente 14, além da presença de trinca ou fratura, fl. 27, ao passo que somente ajuizou a demanda em tela no mês de novembro de 2012, e buscou ajuda profissional apenas em 2014, esperando longo tempo para solucionar a dor que vinha sentindo.
Não havia, ressalto, necessidade de a autora aguardar qualquer autorização judicial para dar continuidade ao tratamento, ainda mais num quadro de dor aguda, conforme confirmado na decisão da fl. 140.
Assim, ainda que tenha havido falha no serviço prestado pela PUCRS, entendo que a indenização devida deve ser reduzida em razão da responsabilidade da paciente pela demora na busca de solução para o problema, estendendo sobremaneira o período de dor e as complicações advindas do tratamento.
Relativamente aos danos morais em si, a prova dos autos é suficiente para evidenciar a dor e o desconforto sofridos pela paciente no dente 14, que foi objeto de tratamento de canal.
O caso da apelante não foi de mera inflamação e inchaço normais, mas algo excepcional e anormal, decorrente da sobra de material deixado no dente 14 - objeto de tratamento endodôntico na PUCRS -, o que somente foi resolvido após a extração dentária, segundo relato da testemunha Márcio.
No que tange ao valor, é sabido que o montante reparatório não há de ser irrisório, de modo a não cumprir com a função expiatória ou não servir de reprimenda a repetições, e também não se deve traduzir em enriquecimento indevido, passível de representar vantagem como se verdadeiro prêmio fosse.
O quantum indenizatório a título de danos morais deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, estar adequado à realidade econômica de ambas as partes, ao grau de culpa e à extensão do dano, atendendo à finalidade reparadora e pedagógico-punitivo da medida.
No caso concreto, a situação extrapolou ao aceitável, certamente abalando a autora durante o período em que permaneceu com dor – embora não se negue que o prazo exacerbado também teve participação da paciente, motivo pelo qual se reduz um pouco o valor indenizatório.
Os prejuízos de ordem moral relativos ao fato em tela são evidentes, bastando ver que a requerente teve sua saúde abalada, buscando outras formas de solucionar a questão e conter o processo inflamatório decorrente do tratamento de canal não realizado da forma mais adequada pela PUCRS, tendo em vista a sobra de material deixada no dente da paciente.
O Código Civil, em seus artigos 944 e 953, parágrafo único, prevê que a indenização se mede pela extensão do dano, cabendo ao Juiz fixar equitativamente o valor da indenização de acordo com as circunstâncias do caso concreto.
Levando-se em conta que a verba arbitrada possui caráter reparatório e pedagógico-punitivo, diante das peculiaridades do presente, mormente diante da concorrência de responsabilidade da autora quanto aos danos extrapatrimoniais, entendo que a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) atende à espécie.
Relativamente aos juros de mora, tratando-se de relação contratual e, como tal, fundada na regra geral dos artigos 405 do Código Civil[2] e 240 do Código de Processo Civil[3], devem incidir desde a citação. O valor da indenização deverá ser corrigido pelo IGP-M a contar do presente arbitramento.
Para ilustrar:
APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO ODONTOLÓGICO. COMPROVAÇÃO DE FALHA NO PLANEJAMENTO E EXECUÇÃO DO TRATAMENTO. REPARAÇÕES MATERIAL E MORAL DEVIDAS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. TERMO INICIAL DE INCIDÊNCIA DOS JUROS DE MORA. (...) Em se tratado de responsabilidade civil contratual, os juros de mora incidentes sobre os valores devidos, tanto a título de reparação material quanto mora, devem ser contados a partir da citação. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA E RECURSO ADESIVO PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70076404490, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 25/04/2018). Grifei.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. TELEFONIA. DANOS MORAIS. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. CITAÇÃO. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. 1. Quanto aos juros de mora sobre o valor da indenização, a jurisprudência desta Corte entende que em se tratando de responsabilidade contratual, como é o caso dos autos, estes devem incidir a partir da citação. 2. Agravo regimental não provido. (EDcl no AREsp 551471/PR Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 17/03/2015).
Consigno que a ação em tela foi ajuizada em 07/11/2012, quando ainda não era obrigatório declinar o valor postulado relativamente ao dano extrapatrimonial, de modo que se aplica, à espécie, o que dispõe a Súmula nº 326 do Superior Tribunal de Justiça: Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca.
Assim, levando-se em conta que o pedido de indenização por dano material abarcava apenas a ABO/RS, com relação à corré PUCRS a autora obtém integral provimento em seu pleito (exclusivamente de dano moral).
Diante do presente resultado, deverá a parte autora arcar com 50% das custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios aos patronos da ABO/RS, os quais mantenho no patamar arbitrado na origem, 15% do valor da causa - até porque não sobrevieram contrarrazões da aludida demandada. Suspensa a exigibilidade da verba de sucumbência em face da demandante diante da gratuidade judiciária concedida na fl. 32. Por sua vez, a corré PUCRS deverá arcar com os outros 50% das custas e despesas processuais, assim como honorários advocatícios devidos ao FADEP - já que a autora é patrocinada pela Defensoria Pública -, os quais arbitro em 15% sobre o valor da condenação.
Por fim, sabe-se que, no sistema de persuasão racional adotado no processo civil brasileiro, o juiz não está obrigado a se manifestar sobre todas as alegações e disposições normativas invocadas pelas partes, bastando menção às regras e fundamentos jurídicos que levaram à decisão de uma ou outra forma. Assim, dou por devidamente prequestionados todos os dispositivos constitucionais, legais e infralegais suscitados pelas partes no curso do processo, a fim de evitar a oposição de aclaratórios com intuito prequestionador.
Registro, por entender oportuno, que será considerada manifestamente protelatória eventual oposição de embargos declaratórios com propósito exclusivo de prequestionamento ou com notória intenção de rediscussão da decisão da Câmara, na forma do artigo 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Do exposto, readequando a sucumbência nos termos da fundamentação, voto pelo PARCIAL PROVIMENTO da apelação para condenar a PUCRS a pagar indenização por danos morais à autora no valor de R$ 5.000,00, que deverá ser corrigido pelo IGP-M a contar deste julgado e acrescido de juros de mora de 1% desde a citação.
Outrossim, deixo de aplicar o disposto no artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil, diante do teor do AgInt nos EREsp nº 1539725/DF, tendo em vista que o presente recurso resta parcialmente provido.
Corrijam-se cadastro e autuação para constar ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ODONTOLOGIA – SEÇÃO RIO GRANDE DO SUL – ABO/RS como apelada, e não apenas interessada.
Des. Eduardo Kraemer - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Eugênio Facchini Neto (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. EUGÊNIO FACCHINI NETO - Presidente - Apelação Cível nº 70079445615, Comarca de Porto Alegre: "APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: KARLA AVELINE DE OLIVEIRA
[1] Audiência de instrução, fls. 207/208, com oitiva de testemunha pelo sistema DRS e acesso via portal do TJRS.
[2] CC. Art. 405. Contam-se os juros de mora desde a citação inicial.
² CPC. Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor, ressalvado o disposto nos arts. 397 e 398 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).